domingo, 12 de julho de 2009

água nos olhos, parte onze

o médico estava já no altar, elegante sem seu terno preto e clássico, colecionando aflições de pré-casamento e repensando milhares de vezes se estava fazendo a coisa certa. se adrielly seria sempre aquela menina dócil e fresca que o fazia sentir borboletas em seu estômago. e se seus olhos fossem suficiente para fazê-lo feliz o resto da vida. suas dúvidas rodopiavam, em ciclos sem fim, sem encontrar nenhuma resposta. no fundo, gostaria que adrielly adrentasse logo e acabasse com aquele sofrimento inútil.
eliane, adornada por aquele vestido longo e verde presenteado pelo futuro genro, começava a se preocupar. viu a moça que cuidava da ordem das coisas da igreja e lhe sussurrou que fosse ver onde estava a noiva, e ela logo se apressou a passos rápidos. olhou para o futuro genro em pé, esperando pateticamente, e lhe correu que suas feições não mostravam a ansiedade que deveria. passaram alguns minutos, em que a dúvida do homem se transformava em agonia de espera, e a angústia da mãe aumentara, ao pensar que sua filha havia desistido da vida linda que estava escrita em seu destino. a moça voltou apressada, e comunicou aos pés do ouvido do noivo.
- Senhor, tem um homem segurando sua noiva. quer que eu chame a polícia ou...
antes que terminasse a frase, o homem desembestou pelo tapete vermelho, recebendo olhares curiosos das poucas pessoas que ocupavam os bancos.
eliane, pressentindo o pior, mas sem ter ouvido nada, resolveu ir correr atrás, com o coração na boca e as mãos já trêmulas. encontrariam sua filha traindo em frente a igreja? bêbada e estrupiada? ou... talvez... aquele canalha? o carma, o diabo encarnado de adrielly.
olhou ansiosa para alguma das amigas dela, que estavam também já gritando possibilidades dignas de romances baratos para o sumiço da menina, e perguntou lhes baixinho se tinha como o canalha vir a saber do casamento. as três já sabiam de quem se tratavam sem a menção de seu nome, como se isto fosse maldição. uma delas iluminou-se com esta notícia, e contou, com mais êxtase que arrependimento, que comentara com seu marido e este era muito chegado do referido.
tomou de assalto a realidade do advento, antes que a comprovasse, e agora mais do que nunca, a raiva e a ansiedade inundavam todos os seus poros reecheando-a das mais diversas possbilidades daquele encontro. ao abrir as portas da igreja, pouco depois do médico, que tivera contratempos com a organizadora, que insistia em dizer que era melhor ligar para a polícia, pois podia ser um assassino em série. ele havia derrubado a moça no chão, sem noção de sua força masculina e o ardor prenunciante de tragédia que tomava conta de seus espírito agitado. ambos viam adrielly, que chorava alto entrecortado por soluços infantis, e que ao ver seu futuro marido e sua mãe, tentou, com mais vontade, se desvincilhiar dos braços fortes do homem que a segurava.
- largue-a já! vou chamar a polícia, seu imbecil! largue minha mulher já!
paulo se principiava com a mão fechada em punho e o celular na outra. estava vermelho feito um pimentão, e via-se as veias estouradas nas suas têmporas. era só o que faltava alguém querer abusar de sua florzinha no dia do casamento, era só o que faltava. andava a passos largos, certo de que iria bater até matar o desgraçado, quando uma mão enrugada o puxou. olhou para trás, desconcertado e mais bravo do que nunca, e viu dona eliane.
- espera, não faz nada ainda, deixe comigo. você acaba de conhecer o verdadeiro e infeliz pai da isabela. e ele não é nada fácil, acredite.
o homem, diante da situação, soltara adrielly para fazer parecer que todo o tempo os braços dela também procuraram seu corpo. e podia afirmar, diante de qualquer um, que sentia seus dedos curtos procurarem seu corpo enquanto a segurava em seu choro mudo. agora ria, ria de nervoso, e ria do noivo desesperado, com aquela pose aristrocrática de machão, e que de nada valeria contra sua experiência em brigas urbanas.
- vai embora. você já fez seu show. agora, pode ir. vá embora e nunca mais volte.
elaine empunha a mão firme, e usava o tom que tratava seus piores alunos, quando queria lhes ferir. parecia mestra da situação, e tinha os nervos controlados, como se já tivesse passado diversas vezes por situações semelhantes.
adrielly tinha se afastado do impostor, e tinha o rosto abaixado, os braços caídos, como vergonha de algo que não sabia bem se tinha culpa. cumpunha uma imagem desoladora e aflita, pois emitia um choro baixo e de ritmo lento que tentava se amainar nos fins da tempestade.
o homem olhou para a senhora e novamente para o outro. vinha uma vontade enorme de matá-lo e o encarou. sentindo o olhar desafiador, paulo resolvera gritar, precedendo sem se exaltar, como fizera eliane.
- vai embora, seu desgraçado, que a polícia logo chega. vai embora para conservar um pouco de dignidade em você. deixa essa menina ser feliz comigo, porque com você parece-me que ela jamais foi.
foi até adrielly e transpassou seus braços por sua cintura, beijando sua cabeça.
- eu não posso ver isso, eu não posso ver que nojo que é isso. você não sabe de nada, você nunca vai saber o que rola entre nós dois, e que ela nunca vai amar outro homem como me amou. gosta de ouvir isso, malandrão? gosta? se ela quisesse teria se soltado de mim, mas ela gosta... ela ainda gosta... ela ia fugir comigo se tivessem demorado um pouco mais.
ainda que a noite parecia estar mais escura que o normal, via-se as lágrimas escorrendo pelo rosto do homem, como um rato que pensa ser desafiador, mas o que faz é apenas chorar a presa fugidia.
a boca de adrielly tremia, seu coração revoltava-se insanamente e quando falou, parecia fazer enorme esforço.
- não, eu não amo você, fabrício. eu não amo você desde o dia que você me violentou e o fruto dela, que é a minha filha, acabou por estragar a minha vida. a única coisa que você fez por mim foi me fazer sofrer, e sofrer não é amar, porque eu sei o que é amar... amar... - e voltou os olhos borrados e molhados para o médico que a avaliava atentamente - é você pra mim, é ser feliz... você...
fabrício riu um riso inescrupuloso. eliane se mexeu, incômoda, largada de ser mestre da situação, e abaixou a cabeça, como embaraçada por um segredo taciturno.
- você quis, doçura. e olha! olha, cara, boa sorte com essa vadia. boa sorte com essa vadia mentirosa, e se você quer realmente acreditar nela, não faço questão. mas a minha verdade, a minha verdade é só minha e não a largo de jeito nenhum, é que quando enfiei meu pau, a buceta dela tava toda molhada e quente. teria guardado a porra então, se tivesse como provar, para desmascarar o que essa vadia anda falando de mim. eu vou embora, e eu prometo... eu prometo nunca mais voltar... só se uma buceta me chamar, se é que você me entende.
virou as costas e saiu correndo, pois na esquina já se escutava a sirene policial e seu estardalhaço. na escada, juntava-se uma platéia heterogênea, composta pelos assombrados convidados, inclusive o tio acordado que mostrava uma pancada roxa na cabeça, e por todos os outros sedentos por porrada e sangue. pipoqueiros, mendigos, prostitutas, senhoras em robes, adolescentes risonhos e toda a corja urbana se misturava aos requintados, boquiabertos e um pouco chorosos, condolescentes dos últimos episódios. adrielly voltara a soluçar diante das últimas palavras ditas com verocidade, e escondia o rosto com as mãos, inacreditada daquela vergonha, disposta a odiar eternamente as mãos que escreviam sua história e aqueles olhos verdes glaciais que a torturavam imensamente. tomou o resto do ar que restava em seu peito, e falou com a voz entrecortada e chorosa:
- se você não quiser mais casar comigo mais, eu vou entender, eu... - e recomeçava a soluçar sem concluir pensamentos ordinários que vazavam pelos poros da sua pele.
- adrielly, eu acredito em você, eu acredito em você, florzinha. eu amo você, e nada vai estragar isso. ouviu? eu não darei ouvidos à ninguém a não ser o que você me disser.
o médico, desconcertado diante das tantas lágrimas que saíam daqueles olhos tão pretos e tão arrasadores, queria lhe dizer qualquer coisa que a acalmasse, qualquer coisa que pudesse fazer feliz uma alma que parecia tão ferida que jamais poderia sentir felicidade novamente.
- ele me violentou... e eu nunca vou ser a mesma outra vez, ele não pode negar isso.
- sim, você vai ser, você vai ser a menina alegre e bonita por quem me apaixonei. deixa isso de lado, tudo bem? vamos... deixar o casamento para outro dia, tudo bem?
- não... não... eu não quero adiar, eu quero me casar hoje. se bem que...
sua mãe, que durante o tempo todo, permanecera com a cabeça baixa, entreouviu a proposta do homem e juntou-se aos dois.
- melhor casar hoje, pois assim tudo isso irá se apagar, e vocês poderão ser felizes como planejado. vamos só adiar uma hora, para que ela possa novamente se arrumar e expulsar toda essa gentalha daqui. vem, adrielly, vem, se não só ficarei eu e isabela para assistir o dia mais feliz da sua vida.
a mãe puxou com força seu braço, e adrielly que não queria deixar de olhar aqueles olhos castanhos e acolhedores, que não queria deixar de estar no abraço quente e reconfortador de seu protetor, foi a passos vacilantes.
- mãe, talvez seja melhor adiar, eu estou horrível.
- não seja boba, adrielly, anda.
- mãe... eu não posso. me escuta.
- adrielly, me escuta você. você acha que seu homem vai engulir essa sua história do jeito que você pretende? quanto você acha que mede o amor que ele sente por você? digo por experiência, esses amores pouco duram, e o que resta é a sagacidade da mulher de prender ele entre suas pernas e, também, ao compromisso. vocês tem que se casar hoje, pois assim não dará tempo de ele pensar se quer mesmo levar um pedaço de encrenca para vida dele, que é o que significa esta família, e eu bem sei disso. você tem que casar agora, enquanto ainda resta dó no coração dele.
adrielly sentia-se enojada a cada palavra que sua mãe pronunciava, rapidamente e com frieza, sem medo que aquilo lhe soasse pior do que ouvira de fabrício.
- você não entende nada de amor. ele me ama de verdade, e eu o amo também. você tem inveja porque nunca teve um amor assim. e fala como se eu fosse culpada, como se eu fosse mentirosa. - recomeçava a soluçar, como se quisesse expelir aquela frase fazia muito tempo - você nunca acreditou em mim, mãe.
eliane parara de andar até o carro e olhou nos olhos perdidos em lágrimas de sua filha. abraçou-a, silenciosamente.
- casa hoje, se tem certeza do seu amor. casa hoje, se não tiver pensando em algum canto desta cabecinha teimosa, se o fabrício é o amor da sua vida. se você me provar isso, eu acreditarei em você. de pés juntos, até o final da minha vida.
adrielly enguliu o choro e limpou as lágrimas com as costas da mão.
- tudo bem, mãe. vamos logo com isso.

(...)
me sinto como um escritor de folhetins populares que o faz só para ganhar dinheiro. no caso, não ganho nem dinheiro, e nem tem público, mas ainda me parece uma história fraca e sem real valor.

3 comentários:

  1. há público sim! nao está fraca e não tem valor que pague o que, e como voce escreve. está realmente bom e eu acompanho e espero cada 'episódio' com ansiedade.

    beijos, ale.

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  2. Não se subestime. A história está muito boa e se depender de mim, tem público.
    A descobri hoje e quero elogiar. Não é fraca e tem valor.
    Beijo.

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  3. você sabe que eu sou a sua telespectadora desde sempre(desde a história dos vampiros ,lembra?)sua história tá muito boa mari,por mim ,você fica milionária com a publicação do livro e do FILME!

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